Quando regressei do campo de concentração, enchi o fogão com todos os livros de poesia e queimei-os. Via chamas a contorcer as palavras, depois das frases, depois das páginas. O fumo que se erguia dos poemas em chamas não era melhor nem mais nobre, nem mais atraente do qualquer outro. Não tinha nada de especial. Soube, mais tarde, que Nösel fora preso por ocasião das primeiras buscas, como muitos professores e homens cujo ofício consistia em conhecer o mundo e explicá-lo. Morreu pouco tempo depois num campo de concentração parecido com o meu, um campo de concentração igual a centenas de outros que tinham crescido um pouco por toda a parte do outro lado da fronteira, como flores venenosas. A poesia não lhe fora de nenhuma utilidade para sobreviver. Talvez contribuísse mesmo para precipitar a sua agonia. Os milhares de versos, em latim, em grego e noutras línguas que guardava na memória à semelhança do maior dos tesouros não o ajudaram em nada. Ao contrário de mim, não aceitara com certeza passar por cão. Sim, deve ter sido por isso. A poesia não reconhece os cães. Ignora-os. (da contracapa).
Tradução de Isabel St. Aubyn.
Revisão de Andreia Baleiras.
Capa e grafismo de Luís Henriques.
Maldoror.
Maio de 2025. 323 Págs. broch. Novo.
16. €.