Bravo (Pedro) - Cabeças Cortadas

Escrito mais de dez anos antes da eclosão da pandemia de covid-19 e da catástrofe sanitária e moral daí resultante, este ordenado conjunto de contos de Pedro Bravo manifesta perturbantes premonições do que passou a estar em curso no mundo: uma continuada repetição de desastres consubstanciais ao desenvolvimento. Mas, abarcando também épocas anteriores à nossa, Cabeças Cortadas não é uma ficção visionária, é uma obra assente em realidades ferozes que nem pandemia  nem guerras substituem, embora as empiorem. Explorando um mundo de disfunções que se têm tornado estruturantes, releva-o nos meandros mais impensados  das relações sociais, quer se trate, por exemplo, de experiências médico-farmacêuticas com o corpo humano ou da necessária dependência mortal de drogas psicotrópicas. Cabeças Cortadas constrói-se sobre uma geometria visual de palavras e ideias não pacíficas de que decorre um paradoxal realismo semântico. Acoplamentos voluntários no ritmo dos contos revelam delírio negro, duplos sentidos e amiúde miríades de significados. Mas a poderosa e ágil estrutura da composição literária não deixa que desta miríade decorra confusão. O sentido devém acção. Sexual, sem nunca ser descritivo, vibrante de fúria e imaginação, Cabeças Cortadas - cuja personagem central é o corpo humano - deixa-nos o registo de que as nossas sociedades assentam numa violência grandemente oculta, Júlio Henriques.

Livro ilustrado com desenhos de Miguel Carneiro.

Revisão de Júlio Henriques.

Grafismo e paginação de Gonçalo Mota.

Livros Flauta de Luz.

Julho de 2022. 196 pp. broch.

PVP. 14 €.